quinta-feira, 15 de abril de 2010

A ditadura do século XXI

Um dos vectores que deve caracterizar uma democracia como espaço de liberdade, é precisamente a existência de espaços livres de direito. Que quer isto dizer? Quer dizer que nem todos os aspectos da vida devem estar juridicamente regulados. Nem todos os aspectos da vida são juridicamente reguláveis. Uma sociedade que sente necessidade de regulação até ao mais ínfimo pormenor, até ao paroxismo, não será uma sociedade doente?

Digamos que o fenómeno não é exclusivo da regulação estadual. Antes perpassa todas as esferas sociais onde as normas se podem exprimir. Nos locais de trabalho, nos locais de lazer, até nas relações pessoais. Todas as épocas sofrem das suas obsessões, e estou certo que, no futuro, quando alguém se dispuser a reflectir sobre o quanto descemos e o quanto aceitamos, quando se apaziguar na mente dos homens a loucura do comercio, compreenderão mais claramente todo este absurdo.

O exemplo mais fulgurante parte logo de cima, das instancias de decisão europeia. Os regulamentos e directivas chegam aos magotes. Cada vez mais pormenorizados. Cada vez mais expansivos. Ignoram deliberadamente as especificidades nacionais e absorvem, quando transportados para a realidade nacional, os vícios atávicos de cada sociedade, aqueles que nunca passam... Em Portugal, por exemplo, a criação da ASAE ou, como lhe quiseram chamar, a PIDE dos comes e bebes, incorporou a obsessão pela assépticémia norte-europeia e a tradição inquisitorial lusitana. O pior de dois mundos...

Os conflitos que tradicionalmente se resolviam à chapada à porta do café ou, nos casos mais felizes, com um gentelman-agreement, resolvem-se agora em tribunal com pedidos de indemnização chorudos.

Quem se habituará à nova ditadura, aquela por quem ninguém dá à cara?

L.S