Antes de começar, gostava de vos dizer que este episódio é, no essencial, verídico, estando apenas um pouco floreado com as exéquias que situação exige.
Há uns tempos atrás, no trabalho, uma superior hierárquica (por sinal bem jeitosa), dirigiu-me as seguintes palavras:
- Ó Feliciano! Estás muito ocupado? Não? Olha, arruma-me aqui estes processos. Não me apetece fazê-lo agora.
Ouvida esta ordem, o meu cérebro pensou: «e um minete? Não vai?», ao mesmo tempo que a minha boca dizia:
- Claro. Para já?
- Não… Quando tiveres tempo.
Agora perguntem: como é que nesta situação degradante da condição humana mostra-se útil ser fatalista e pretendente a escritor?
Eu respondo: Ajuda sim senhor! Quando a senhora se dirigiu a mim, pensei: esta senhora não existe e todos os que aqui estão não existem, e talvez eu seja a única realidade pensante no meio deste bando de símios. São apenas sombras, joguetes inconscientes nas mãos do destino. O que a sua boca profere mais não é do que um a voz inconsciente comandada por uma força incógnita, desconhecida, que ao longo da história dos homens vai ditando as suas regras… inexoráveis para toda esta construção frágil e precária a que chamamos civilização. Se esta voz agora me rebaixa ao ponto zero da dignidade, e pretende mesmo aniquilar tudo aquilo que tenho de precioso (diga-se, a memória), é porque é politicamente útil que o faça. No fundo, ela é tão culpada como eu.
Depois de tudo isto me ter ocorrido numa fracção de segundo, senti um conforto terrível e uma certeza inabalável que um dia, talvez quando os bons Deuses do Olimpo acordarem do seu sono, algo semelhante seja recordado por alguém.
sexta-feira, 26 de agosto de 2011
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