Diz-se que na China o
número de suicídios é assombroso. Não só se diz como o comprovam aquelas coisas
fantásticas a que hoje chamamos estatísticas.
Na Ponte de Nanquim,
são muitos os que acabam os seus dias com a belíssima paisagem como pano de
fundo. As razões são conhecidas de todos, para além de factores culturais, os
efeitos sociais devastadores do capitalismo
Numa ocasião de estadia
em Paris, assisti a uma cena cliché bem típica da Cidade Luz: uma rapariga
bela, loira, fumava o seu (último?) cigarro sentada border line, numa ponte histórica sobre o Sena. Neste caso
parisiense, qualquer rapazote bem-apessoado da capital, de tez clara e blazer cinza, resgataria a suicida às
garras esfomeadas da morte. Possivelmente, a moça deslocar-se-ia imediatamente
a Saint Sulpice e confessar-se-ia na
famosa Igreja do Código Da Vinci. De seguida, iniciaria um romance com o seu
salvador
No caso chinês, perante
circunstâncias bem mais prosaicas, desde 2004 que um herói de 39 anos dedica os
seus fins-de-semana a salvar os desesperados. É reconfortante que no mundo
existam heróis desta cepa, ainda que indisponíveis durante a semana.
Se o Governo Chinês se
interessasse pelo caso e desejasse criar postos de trabalho e ainda, para não
se chatear com burocracias laborais, entregasse o recrutamento de salva-vidas
profissionais a uma qualquer outsourcer,
estou certo que os candidatos teriam uma formação intensiva como os artistas do
marketingue, ficando senhores de num argumentário que revigore a força de
viver. Por comodidade, chamemos-lhe o argumentário
da vida.
Um trabalho delicado, este. Quais seriam esses argumentos?
Como convencer um pai de família a não se suicidar, quando este é o único meio
de prover à subsistência da sua família, uma vez que a sua morte implica o
perdão das dívidas? Como convencer um jovem educado na competitividade animal
das universidades, de que a sua vida não acabou apenas porque não conseguiu
ainda arranjar trabalho, um cabriolet novo e uma noiva bonita com traços
ocidentais? Como convenceriam esses funcionários alguém a não cometer suicídio,
quando esse alguém representa mais despesa que receita e, portanto, na linha do
discurso oficial, carrega o fardo de uma vida ineficiente? Tarefa difícil.
Porém, estou seguro de que os esforços destes
senhores não seriam em vão. O nosso voluntário de 39 anos já conseguiu salvar
umas 130 vidas desde 2004. Parece-me, assim, que os tais funcionários, se
fossem pagos à peça como os agentes da Emel,
veriam as suas diligências compensadas, apesar das eventuais desilusões.
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